Foi assim, como num sonho. Estava tudo muito claro e reluzente, talvez até demais para os meus olhos, o lugar era lindo, como montanhas com seus picos cobertos por neve, tudo muito branco, muito claro, quase transparente. Que lugar era aquele?!
Havia pessoas - de longe ao menos pareciam - mas ao me aproximar assustado e perdido percebi que não eram pessoas comuns, eram altos, magros, uniformes, não sei se posso chamar de olhos, cabelos, braços o que tinham. Apenas me passavam uma estranha confiança, havia uma luz muito forte ao redor de cada um, algo até então desconhecido por mim. Aquela sensação estranha me intrigava - não sei se exatamente por isso - eu me aproximava cada vez mais, eu estava com frio, com fome, meus pés machucados sangravam, pois estava andando descalço no chão de pedregulhos.
Os estranhos então notaram-me, por alguns momentos senti medo, mas um deles me estendeu a mão e apenas com um olhar me convenceu a agarrar sua mão. Eu não sentia maldade alguma vindo daqueles seres, era tudo fantástico, enigmático. Então vieram mais dois e levaram-me a um abrigo. Ao chegar os vi conversando pela primeira vez, estranho - acho que é essa a palavra - eu não entendia absolutamente nada, que dialeto era aquele?! Parecia grunhidos como de um mudo, mas o intrigante mesmo era reparar como eles conseguiam grunhir tão pouco e se compreenderem tão bem.
Que noite maravilhosa passei me senti em casa, me senti bem, acompanhado, eles me fizeram curativos nos pés, faziam gestos com a mão e o corpo como se estivessem querendo me dizer algo, talvez que me conheciam, que sabiam da minha vida, aparentemente tinham dó de mim, e um amor muito grande, algo como compaixão.
Dias se passaram e eu cada vez mais prestava atenção em sua comunicação, eles me manteram muito bem, fui sarando aos poucos de todas as minhas dores e esquecendo as mágoas terrenas, era tudo maravilhoso demais, eu gostaria de poder retribuir, ao menos entender o porquê daquilo tudo.
Meses se passaram e fui me familiarizando com seu dialeto, apesar de não demonstrar nem tentar me comunicar com eles. E no meu melhor momento apareceu um outro ser, diferente, parecia com mais autonomia, mas nenhuma maldade também, então ele me levou à um outro lugar, nos acomodamos e ele começou a me explicar que eu havia sido escolhido para salvar o meu povo, o mundo das roupas pretas, a Terra. Eu não entendia o porquê disso, mas ele preocupado, explicou-me que seria a última tentativa deles de resgatar a paz e o amor na Terra, e simplesmente pegaram e mostraram para um mortal como eu que é possível amar sem exigir nada em troca, que é possível e confortável fazer o bem ao próximo. O que eu não sabia era da missão que eu haveria de cumprir aqui na Terra.
Pois bem, logo após de tudo explicado eu me senti honrado por essa escolha e responsabilidade que a mim foi empregada, chorei por lamentar não poder mais ficar lá com eles, mas sabia que ali não era o meu lugar, não ainda.
O anjo então me levou para o topo da montanha mais alta e apontou para baixo mostrando-me uma rosa, uma linda e frágil rosa branca que estava sobrevivendo em meio àquele cenário frio, com toda aquela geada, e sem mais plantas ao seu redor, ele então disse-me:
- Aquela é a esperança, todas as outras flores ao seu redor morreram, desistiram de lutar, aquela é você, e os seus sentimentos positivos, aquela é o motivo de nós o termos escolhido, se você desistir aquela rosa morre, não a deixe secar, lembre-se dela todas as noites durante sua jornada.
Então, sem mais demora virei-me para o anjo e com uma última lágrima escorrendo pelo meu rosto indaguei:
- Adeus.
Foi quando acordei na minha cama, no meu quarto, na minha casa.
É, e foi assim que aprendi a falar a língua dos anjos.
Ederson R. Zanchetta - 26 de Abril de 2005